Jornalista Amazônica | Camila Garcêz

as águas dos rios da Amazônia e as vozes das florestas moldaram minha visão de mundo

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Sou filha de Manacapuru, e isso diz muito sobre mim.

Sempre que me perguntam de onde eu sou, não penso duas vezes antes de responder com orgulho: Sou filha de Manacapuru!. E faço questão de dizer isso em todo canto que eu vá. Manacapuru é uma cidadezinha do interior do Amazonas, com nome de origem tupi, que significa Flor Matizada, uma flor que nasce roxa como a terra e morre branca, e é bem comum por lá. Esse nome, além de poético, também batiza uma das cirandas do tradicional Festival de Cirandas de Manacapuru, um evento folclórico que movimenta a cidade, impulsiona o turismo e enche o coração de quem dança.

Mas não é só pela beleza da palavra que falo tanto sobre onde nasci. É porque eu acredito que a cidade onde eu nasci moldou quem eu sou, enquanto mulher, amazônida, comunicadora e sim, agente de transformação. Cresci onde se dança ciranda, e acredite: dançar ciranda é quase uma aula de sociologia em movimento. Foi ali, brincando de roda, que aprendi sobre a história do meu povo, sobre os Guerreiros Mura que viviam na região antes da colonização (inclusive, Mura é o nome de outra ciranda), sobre o ciclo da borracha, a Amazônia dos livros e a Amazônia real. Aprendi sobre a identidade ribeirinha, sobre aquecimento global e sobre como a cultura, quando acessível, planta um sentimento de pertencimento que nenhum evento histórico consegue apagar.

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Além da cultura, tem um outro fator fundamental que me formou: o acesso à educação pública e às políticas públicas. Minha avó, uma mulher indígena colombiana que não pôde conhecer o nome do próprio povo (fruto do apagamento histórico e das migrações forçadas que ela viveu), saiu da comunidade ribeirinha de Canabuoca em busca de algo raro naquela época: oportunidade. Sozinha, sem saber ler ou escrever, ela decidiu ir para o centro de Manacapuru para dar um futuro diferente aos filhos. Trabalhou como empregada doméstica na igreja matriz por anos, criou 11 filhos numa casinha de madeira simples, e nunca deixou de lutar para que todos estudassem.

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Minha mãe foi uma dessas filhas, virou professora, e com ela aprendi desde cedo que educação é um ato revolucionário. Estudei em escola pública a vida inteira e, aos 12 anos, graças a uma política pública, viajei sozinha de avião pela primeira vez para participar da Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente, uma iniciativa liderada pela então Ministra Marina Silva. Lá, eu e outras crianças de todos os cantos do Brasil escrevemos a Carta das Responsabilidades, entregue pessoalmente ao presidente Lula. (Sim, eu estava lá cheia de orgulho e sendo vista na tv pela família toda)

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Voltei à essa mesma conferência aos 17 anos, desta vez como facilitadora da oficina de educomunicação. A carta da vez foi entregue à presidenta Dilma, e ali eu percebi que eu não era só boa de discurso, eu era boa em comunicar ideias para transformar realidades.

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Na juventude, virei militante. Organizei ações ambientais, entrei para o Coletivo Jovem de Meio Ambiente do Amazonas, participei da Comissão de Meio Ambiente do município, e fui cursar faculdade em Manaus. Sonhava ser jornalista, mas uma decisão do Congresso dizendo que não precisava mais de diploma para isso, deixou minha mãe preocupada. Resultado: fui fazer Meteorologia (porque talvez quisesse ser a garota do tempo e também porque estudar o céu parecia poético), mas desisti no terceiro período, porque a poesia acabou assim que a matemática apareceu. Depois tentei Odontologia, estudei quatro períodos, me apaixonei pela anatomia, sinapses, fisiologia… mas sentia que conhecer o corpo humano era mais curiosidade, do que profissão. Acho que esqueci de falar isso sobre mim, eu sempre fui muito curiosa. Desde pequena, quando ainda não tinhamos um site de busca e nem acesso à internet, eu me debruçava sobre livros, a barsa, quem lembra dela? foi minha companheira de muitas perguntas.

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Quando entendi que essa curiosidade tinha a ver com vontade de contar histórias, finalmente fui atrás do meu sonho: com uma bolsa integral do ProUni, cursei Jornalismo na Faculdade Martha Falcão Wyden. Trabalhei na área desde o primeiro semestre e logo percebi que eu nunca seria jornalista de redação. Porque eu não cabia numa bancada. Eu era das ruas, dos debates, das causas. E fui fazer disso meu caminho: me envolvi com direitos humanos, direitos LGBT+, direitos das mulheres e, como um bom amor que sempre volta, reencontrei com meu ativismo socioambiental.

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Em 2023, fui uma das 10 jornalistas amazônidas selecionadas para cobrir a COP 28 em Dubai, pela DW Akademie e a ONG Saúde e Alegria. Foi minha primeira viagem internacional, e que estreia! Produzi o podcast Nós na COP, explicando o que é esse evento climático global para quem mais precisa entender: as pessoas da Amazônia. Gente como a minha avó, minha mãe, minhas tias. Gente que sente no corpo os impactos da crise climática. Nesse mesmo projeto, produzi uma reportagem sobre Sistemas Agroflorestais, publicada pelo Mídia Ninja, Brasil de Fato e Jornal A Crítica, um registro histórico sobre a seca de 2023, as queimadas e o que os povos da floresta estão fazendo para resistir.

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Em 2023, fui uma das 10 jornalistas amazônidas selecionadas para cobrir a COP 28 em Dubai, pela DW Akademie e a ONG Saúde e Alegria. Foi minha primeira viagem internacional, e que estreia! Produzi o podcast Nós na COP, explicando o que é esse evento climático global para quem mais precisa entender: as pessoas da Amazônia. Gente como a minha avó, minha mãe, minhas tias. Gente que sente no corpo os impactos da crise climática. Nesse mesmo projeto, produzi uma reportagem sobre Sistemas Agroflorestais, publicada pelo Mídia Ninja, Brasil de Fato e Jornal A Crítica, um registro histórico sobre a seca de 2023, as queimadas e o que os povos da floresta estão fazendo para resistir.

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Minha história pode até ter começado numa casinha de madeira na beira do rio, mas ela já sobrevoou estados, atravessou oceanos e chegou a lugares que aquela menina de Manacapuru mal podia imaginar. E tudo isso começou com uma menina que dançava ciranda em Manacapuru, e que acreditou que podia mudar o mundo.

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